Walter Lippmann (1922) descobriu, no seu livro «Public Opinion», que a observação dos factos e dos eventos é filtrada, inclusive moralmente, por pontos de vista selectivos, pontos de vista orientados por estereótipos ou códigos. As pessoas vêem o mundo tal como este se reflecte na «opinião pública» e as avaliações morais são canalizadas por estereótipos, ficções e símbolos carregados de emoções. As pessoas vivem, portanto, num mundo limitado por estes «preconceitos» difundidos pelos mass media, com os quais fazem face à complexidade, à grandeza e à fugacidade do mundo. Embora trate da opinião pública, Lippmann não oferece nenhum conceito de opinião pública, limitando-se a mostrar como se transmite e como se impõe a opinião pública. O estereótipo, seja negativo ou positivo, é tão conciso e tão pouco ambíguo que possibilita a todas as pessoas saber quando devem falar e quando devem ficar caladas. Por isso, é indispensável para pôr em andamento os processos de conformidade social. No seu livro «The Spiral of Silence», Elisabeth Noelle-Neumann (1984) apresenta uma teoria da opinião pública, elaborada a partir de um acto eleitoral (1972). Chama-se «hipótese da espiral do silêncio», que vou reformular nestes termos: Num debate público sobre determinado tema, as pessoas expressam abertamente e defendem com confiança os seus pontos de vista. As que recusam a perspectiva dominante (aquela que parece ter mais apoio explícito) sentem-se marginalizadas e, frequentemente, retiram-se e calam-se. Esta inibição faz com que a opinião que recebe apoio explícito pareça mais forte do que é realmente, e a outra, mais débil. Num processo em espiral, o ponto de vista mais visível e explicito acaba por dominar a cena pública e o outro desaparece da consciência pública, devido ao facto dos seus apoiantes ficarem silenciosos, por terem medo do isolamento. Aliás, na peugada dos estudos de Solomon Asch, Noelle-Neumann defende que o medo do isolamento é a força que põe em marcha a espiral do silêncio, mas é provável que outros programas filogenéticos contribuam para a produção desse efeito. Esta hipótese da espiral do silêncio tem sido muito debatida e qualquer programa de teorias da comunicação social aborda esta teoria da opinião pública, como se ela resistisse a todos os testes empíricos que possam ser imaginados para a refutar. Mas, mesmo ao nível da mera argumentação racional, a teoria de Noelle-Neumann mostra-se fraca quando confrontada com a obra «Mudança Estrutural da Esfera Pública» de Jürgen Habermas. Noelle-Neumann encontra no passado muitos autores que corroboram muitas das suas teses, tais como Hobbes, Tocqueville, Rousseau, David Hume, John Locke, Lutero, Maquiavel, John Hus ou mesmo os escritores da Antiguidade Clássica. Para todos os efeitos, tem o mérito de possibilitar encarar a opinião pública como uma espécie de tirania da maioria, contra a qual nos devemos proteger e lutar para que a democracia saiba defender-se dessa tirania mediada e imposta pelos mass media tradicionais. Isto é o liberalismo político defendido por Stuart Mill: «Não basta, portanto, a protecção contra a tirania do magistrado: carece-se também de protecção contra a tirania da opinião e do sentimento dominantes, contra a tendência da sociedade a impor, por outros meios além das penas civis, as suas próprias ideias e práticas como regras de conduta àqueles que divergem delas, e a estorvar o desenvolvimento e, se possível, impedir a formação de alguma individualidade em desacordo com os seus fins, compelindo todos os caracteres a imitar o modelo do dela. Há um limite na ingerência legítima da opinião colectiva sobre a independência individual; e achar esse limite e mantê-lo contra a usurpação é tão indispensável para o bom andamento dos negócios humanos como a protecção contra o despotismo político». Trata-se efectivamente de uma concepção política da liberdade e, tal como afirma Hannah Arendt, não vejo outra concepção alternativa ou outro espaço em que posso ser livre a não ser no espaço público. Os luso-corruptos odeiam visceralmente o liberalismo político: o poder judicial ou, como diz Stuart Mill, a tirania do magistrado, bem patente no caso "Apito Dourado" ou no abuso das escutas telefónicas, deve ser limitado, nomeadamente pelo poder legislativo. Mas, como sabemos, em Portugal, o direito é a arma dos poderes luso-corruptos instituídos e nem sequer os bancos privados que seguem aparentemente um modelo anglo-saxónico de gestão escapam à regra latina. J Francisco Saraiva de Sousa
2 comentários:
Gostei muito deste texto! :)
Obrigado Helena. :)
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