quinta-feira, 26 de julho de 2007

HETERONOMIA E SUBJECTIVIDADE REBELDE

Projecto de uma escola como instituição crítica




«Encontramo-nos esmagados pelo peso dos mass-media, pelas imagens do poder, por uma manipulação do imaginário ao serviço de uma ordem social opressiva, pelo fabrico, a qualquer preço, de um consenso majoritário, pelo culto da tranquilidade, por procedimentos que consistem em aterrorizar as pessoas a propósito de tudo e de nada, em infantilizá-las, de forma que já não coloquem questões».

FÉLIX GUATTARI


A «educação» e as «ciências da educação» estão na ordem do dia.
Existem inúmeros manuais de ciências da educação. Conforme demonstrou Thomas S. Kuhn
[1], os manuais escolares que expõem os paradigmas e as teorias das ciências paradigmáticas são manuais consensuais: neles os alunos (ou leitores) encontram sempre as «certezas» da disciplina que estão a estudar; as suas dificuldades teóricas são sistematicamente omitidas. O aluno (ou o leitor) sente-se confiante e seguro: a ciência que estuda cresce sem dificuldades. Mas, se isto é relativamente verdade para as ciências objectivas da natureza, o mesmo já não pode ser dito das ciências que ainda se confrontam com diversos paradigmas científicos, sem saberem qual deles adoptar como modelo de toda a sua investigação normal. Os manuais destas ciências multi-paradigmáticas (ou pré-paradigmáticas) são necessariamente muito menos consensuais que os manuais escolares das ciências paradigmáticas.
Ora, as ciências da educação ainda não são ciências paradigmáticas. Até mesmo o seu «objecto» de estudo é alvo de múltiplas controvérsias científicas e filosóficas. Isto significa que os manuais escolares que se escrevem sobre as ciências da educação, embora se imitem uns aos outros quanto à sua estrutura, não partilham necessariamente da mesma problemática teórica da educação, sendo obrigados — cada um deles — a fazer as suas próprias opções teóricas em função dos interesses dos seus autores. Contudo, esta liberdade de escolha foi tolhida pelo próprio sistema que profissionaliza as ciências da educação: a planificação da cultura afunda-se em si mesma, ao mesmo tempo que anula a formação cultural como promessa de maioridade
[2].
No contexto desta ofuscação teórica, uma teoria radical da educação surgiu nas últimas décadas. Amplamente definida como teoria crítica da educação, a pedagogia crítica apresenta uma variedade de contralógicas importantes à análise positivista, não-histórica e despolitizada, utilizada pela pedagogia administrada da escolarização — uma análise facilmente visível nos programas de profissionalização nos Departamentos de Educação das nossas Faculdades. A profissionalização do exercício de ensinar é realizada contra aquilo que devia ser o ensino: o espaço da construção da subjectividade do estudante e da conquista da autonomia. Se este é o objectivo do opressor, não o é daquele que resiste a ser tratado como uma mera coisa. Coisificação
[3] e planificação pedagógica[4] são a mesma coisa — necrofilia.
A denúncia dos ideais de educação que guiam a escola administrada foi feita por Theodor W. Adorno de modo enfático: «Qualquer debate sobre ideais de educação é vão e indiferente em comparação com este: que Auschwitz não se repita. Aquilo foi a barbárie, à qual toda a educação se opõe. Fala-se de iminente recaída na barbárie. Mas ela não é iminente, uma vez que Auschwitz foi a recaída; a barbárie subsistirá enquanto perdurarem, no essencial, as condições que produziram aquela recaída. Esse é que é todo o horror»
[5].
Auschwitz, encarado como símbolo da crueldade mais cruel jamais cometida pelo homem na sua história dos vencedores
[6] — uma vez que se trata de um assassínio racionalmente planeado e tecnicamente executado pelos carrascos de Hitler —, não pode nem deve ser esquecido, a menos que se deseje não só perpetuar a miséria existente, como também neutralizar e inibir o esforço que procura impedir a sua repetição. A sua recordação — pelo contrário — pode ajudar-nos a resistir à barbarização da sociedade administrada e a lutar objectiva e subjectivamente contra ela, na tentativa desesperada de evitar a repetição de novas crueldades. Contra aqueles historiadores que, durante o processo de reunificação da Alemanha, quiseram esquecer o seu passado mais recente, Adorno já tinha dado — sem nunca ter podido participar da Disputa dos Historiadores, como é evidente — a sua resposta: «Os assassinados são defraudados até mesmo da única coisa que a nossa impotência pode garantir-lhes: a recordação»[7]. Estas palavras fazem eco de outras, não menos enfáticas, pronunciadas por Walter Benjamin: «O dom de atiçar através do passado a chama da esperança pertence apenas ao historiógrafo perfeitamente convencido que diante do inimigo, e no caso deste vencer, nem sequer os mortos estarão em segurança. E este inimigo não tem cessado de vencer»[8].
Horkheimer reforça esta necessidade de manter viva a memória dos que não tiveram uma morte digna, atribuindo à filosofia a tarefa de traduzir o seu sofrimento numa linguagem da resistência: «Os verdadeiros indivíduos do nosso tempo são os mártires que atravessaram os infernos do sofrimento e da degradação na sua resistência à conquista e à opressão, e não as personalidades bombásticas da cultura popular, os dignatários convencionais. Esses heróis não celebrados expuseram conscientemente a sua existência como indivíduos à aniquilação terrorista que outros arrostam inconscientemente através dos processos sociais. Os mártires anónimos dos campos de concentração são os símbolos da humanidade que luta para nascer. A tarefa da filosofia é traduzir o que eles fizeram numa linguagem que será ouvida, mesmo que as suas vozes finitas tenham sido silenciadas pela tirania»
[9].

1. A teoria crítica da educação é herdeira do pensamento social dos pensadores da Escola de Frankfurt
[10]. Vários teóricos educacionais críticos, em particular Henry Giroux e Peter McLaren, inspiram-se fundamentalmente no trabalho teórico da Escola de Frankfurt, que teve o seu início antes da Segunda Guerra Mundial, na época da República de Weimer[11], com a criação oficial do Institut für Sozialforschung (Instituto de Pesquisa Social) em 1923, filiado na Universidade de Frankfurt. Os membros deste grupo, que se empenharam na crítica radical das sociedades industriais avançadas, incluíram pensadores tais como Max Horkheimer, Theodor W. Adorno, Walter Benjamin, Leo Löwenthal, Erich Fromm e Herbert Marcuse. Com a tomada do poder por Hitler, Max Horkheimer que dirigia o Instituto desde 1930 é demitido e com ele todos os seus membros fundadores judeus. Financiado desde o começo por homens de negócios da comunidade judaica, em particular por Felix J. Weil, que lhe garantem a independência, o Instituto sobrevive. Os seus fundos são transferidos para a Holanda. São criados anexos em Genebra, Londres e Paris, mas o único estabelecimento com o destino de se tornar num local estável para os investigadores exilados é a Universidade de Colúmbia, que lhes cede um dos seus edifícios. Aí trabalham Max Horkheimer, Leo Löwenthal e, a partir de 1938, Theodor Adorno. Depois da guerra, Horkheimer e Adorno, entre outros, regressam à Alemanha, onde reabrem novamente o Instituto em Frankfurt. Membros da segunda geração de teóricos críticos, tais como Jürgen Habermas e Albrecht Wellmer, saíram desde então do Instituto para continuar noutros lugares o trabalho iniciado pelos membros fundadores.
O contributo mais importante da teoria crítica, no âmbito do projecto moderno de emancipação racional, foi, sem dúvida, a crítica da racionalidade instrumental. Este projecto de crítica da razão possui um sentido clássico: o de que a razão deve efectuar a sua própria crítica, na medida em que procura definir os seus limites e evitar eventuais maus usos de si mesma. A outra face desta retomada do empreendimento kantiano da autocrítica da razão é claramente hegeliana: uma crítica da atrofia da razão reduzida ao «entendimento». O processo de formalização da razão desenvolve-se gradativamente ao longo dos séculos até culminar com a fixação do pensamento no dado. «De Hume aos positivistas lógicos da actualidade o princípio [de qualquer forma de positivismo] tem sido o prestígio definitivo do facto e o seu método fundamental de verificação, a observação do dado imediato. O positivismo assumiu, em meados do século XIX, e principalmente em resposta às tendências destrutivas do racionalismo, a forma de uma “filosofia positiva” que englobaria todo o saber e que iria substituir a metafísica tradicional. As figuras mais eminentes deste positivismo acentuaram com muito vigor a atitude conservadora e acrítica da sua filosofia: o pensamento era por ela induzido a contentar-se com os factos, a renunciar a transgredi-los e a submeter-se à situação vigente»
[12]. Com o positivismo a realidade existente adquire valor essencial e primazia em relação ao devir histórico, à transformação e à transcendência: o pensamento imobiliza-se perante a realidade tal como ela é.
Segundo Horkheimer, a razão objectiva designa «a existência da razão como um poder inserido não só na consciência individual, mas também no mundo: nas relações entre os seres humanos e entre as classes sociais, nas instituições sociais e na natureza e suas manifestações. Os grandes sistemas filosóficos, tais como o de Platão e de Aristóteles, a escolástica e o idealismo alemão, [...] [desenvolveram] um sistema abrangente, ou uma hierarquia, de todos os seres, incluindo o homem e os seus fins. A sua estrutura objectiva, e não apenas o homem e os seus propósitos, era o que determinava a avaliação dos pensamentos e das acções individuais»
[13]. A razão objectiva encerra uma estrutura própria, funcionando como medida ou critério de verdade para os pensamentos e as acções individuais. Uma tal concepção de razão vinculava-se, na actividade do ser humano, mais com a determinação de fins do que com a mera escolha de meios. Uma diferença considerável separa esta tradição filosófica pré-moderna — segundo a qual a razão é um princípio inerente ou constituinte da própria realidade onde se insere e se desenrola a vida do homem —, das linhagens de pensamento que se inauguram a partir do século XVII, que tendem a compreender a razão como capacidade ou faculdade do espírito. Em consequência deste último ponto de vista, tematizado por Descartes, só o sujeito humano, o ser consciente, pode rigorosamente ser considerado portador de racionalidade. Assim, a razão subjectiva equipara-se a uma faculdade de operação lógica, de dedução, de sistematização e cálculo, não importando tanto, em si mesmos, os conteúdos postos em correspondência com ela. Ela compreende-se, passo a passo, através da modernidade, como capacidade de relacionar meios, de adequação de procedimentos a fins, fins mais ou menos aceites por si ou, cada vez mais, tomados como óbvios. «Concede pouca importância à indagação de se os propósitos como tais são racionais. Se essa razão se relaciona de qualquer modo com os fins, ela tem como certo que estes são também racionais no sentido subjectivo, isto é, de que servem ao interesse do sujeito quanto à autopreservação — seja a do indivíduo isolado ou a da comunidade de cuja subsistência depende a preservação do indivíduo. A ideia de que um objectivo possa ser racional por si mesmo — fundamentada nas qualidades que se podem discernir dentro dele — sem referência a qualquer espécie de lucro ou vantagem para o sujeito, é inteiramente alheia à razão subjectiva, mesmo quando se ergue acima da consideração de valores utilitários imediatos e se dedica a reflexões sobre a ordem social como um todo»[14]. Neste sentido, a razão subjectiva passa a constituir uma relação directa, fundamental, com a autoconservação, um dos princípios supremos do pensamento liberal moderno.
A teoria crítica apresenta-se, na sua primeira fase, como herdeira e devedora de um conceito de razão como razão objectiva, da maneira como o compreendem os filósofos do idealismo alemão, mediado com o outro princípio fundamental do pensamento moderno: a consciência-de-si. A ideia de uma nova filosofia crítica por oposição à teoria tradicional encontra-se lançada no ensaio programático de Horkheimer — Teoria Tradicional e Teoria Crítica (1937). A teoria tradicional, criada por Descartes, limitava-se a ordenar «a experiência a partir de uma problemática corolária da reprodução da vida no interior da sociedade no seu estado presente. Os sistemas das diferentes disciplinas continham os conhecimentos sob uma forma que, nas circunstâncias dadas, os torna utilizáveis num maximum de casos. A génese social dos problemas, as situações reais nas quais é utilizada, os objectivos aos quais é aplicada aparecem-lhe como situados fora de si mesma»
[15]. Dedicava-se basicamente à descrição minuciosa do que é dado, encontrado, no plano natural ou social, para efeito da sua posterior explicação. Horkheimer procura um tipo de actividade teórica que, por um lado, respeita e reconhece a validade de tal postura, mas, por outro lado, aponta nela duas lacunas importantes. Em primeiro lugar, acusa-a de não reflectir sobre os seus pressupostos «extrateóricos», isto é, histórico-culturais e sociais, não indagando em que medida elementos éticos, políticos, ideológicos e sociais, podem tornar-se presentes interferindo na sua produção. Além disso, enquanto a actividade teórica racional limita-se à lógica interna da investigação, permanece incapacitada de reflectir sobre o papel e o sentido da actividade por ela realizada no «mundo da vida». «A teoria crítica da sociedade toma por objectos os homens enquanto produtores da totalidade das formas que a sua vida reveste na história. As condições da realidade, das quais procede a ciência, não lhe aparecem como dados que se procura unicamente constatar e prever segundo as leis das probabilidades. O que é dado em todas as circunstâncias não depende apenas da natureza, mas também dos poderes que o homem exerce sobre ela. Os objectos e o modo da sua percepção, a problemática e o sentido das respostas que lhe são dadas derivam de uma actividade humana e do grau da sua potência»[16].
No projecto inicial da teoria crítica, Kant, Hegel, Marx e Lukács são influências decisivas. Destes autores deriva a preocupação de se transformar conscientemente o mundo, de se procurar realizar a razão na vida social. Tal realização inspira-se num traço inconfundível da ética kantiana: a reconciliação entre o individual e o universal operada pela razão prática. A sua realização no âmbito de uma filosofia política procura, entretanto, escapar de algumas das dificuldades em que caiu a filosofia kantiana no seu empreendimento para «salvar a liberdade», sendo as mais frequentemente mencionadas o dualismo nítido da solução filosófica que recorre à distinção de “dois mundos” e a exterioridade da crítica moral à realidade empírica, o que se encontra na raiz das típicas oposições entre ser e dever-ser. O recurso a Hegel possibilita evitar os obstáculos que se ergueram no caminho da filosofia prática de Kant. Hegel enfrenta os mesmos problemas de um outro ponto de vista: a razão só pode ser realizada onde ela, de alguma forma ou de certo modo, já esteja presente: só o que é potencialmente racional torna-se efectivamente razão. Nos Princípios da Filosofia do Direito, Hegel formula lapidarmente o princípio de identidade em torno do qual gira toda a sua filosofia: «O que é racional é real e o que é real é racional»
[17].
Contudo, Horkheimer, Adorno e Marcuse procuram distanciar-se de determinados elementos da concepção hegeliana da história capazes, na sua perspectiva, de se prestar a possíveis capitulações teóricas diante da ordem estabelecida. Embora Hegel represente o esforço mais bem-sucedido de mediar razão e realidade ou pensamento e ser, a teoria crítica afirma-se, desde logo, como uma crítica do idealismo tomado como pensamento identificador e concluído. A XI Tese sobre Feuerbach de Marx, segundo a qual «os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras; trata-se, porém, de o transformar», denuncia a falsa identidade hegeliana como mitologia conceptual, apontando para uma praxis revolucionária susceptível de reconciliar aquilo que se apresenta não reconciliado na presente ordem estabelecida. O pensamento identificador torna-se inimigo da verdadeira reconciliação: «Da dialéctica materialista tal como está contida na teoria crítica, não se admite — ao contrário de Hegel [ou mesmo de Lukács] — a unidade do pensamento e da história. Na actualidade existem formas de vida reais e históricas, cuja irracionalidade se tem rendido já ao pensamento. A dialéctica não é algo concluída como processo. Entre o pensamento e o ser não reina nenhuma harmonia, mas a contradição apresenta-se ainda hoje em dia como uma força impulsora; e não só entre o homem e a natureza, mas especialmente entre os próprios homens com as suas necessidades e capacidades e a sociedade como seu produto. A superação realiza-se, por conseguinte, na luta real e histórica entre aqueles indivíduos que representam as necessidades e as capacidades, isto é, a universalidade, e os que representam as formas estereotipadas, isto é, os interesses particulares»
[18]. A teoria crítica é assim reenviada à crítica marxiana da economia política, compreendida como uma orientação acerca das condições necessárias para a realização da razão na sociedade moderna.
Para Marx, a razão realizar-se-ia ou começaria a efectivar-se a partir do momento em que os homens se tornassem verdadeiramente associados e regulassem consciente e livremente o seu intercâmbio material com a natureza. A descrição da lógica da sociedade capitalista, realizada por Marx na sua obra O Capital, não possui o estatuto de um fim em si mesmo, mas assenta no pressuposto normativo da representação de uma sociedade humana na qual não haja mais miséria, exploração e opressão, e o trabalho obrigatório seja gradualmente abolido, e, portanto, a liberdade possa ser igualmente conquistada e desfrutada por todos. A crítica marxiana fornece um elemento de historicidade frutífero, na medida em que para os teóricos críticos fundadores o materialismo histórico foi sempre considerado uma teoria aberta e nunca um corpo de verdades prontas para a aplicação indiferenciada como sucede na metafísica marxista. Aliás, este aspecto já tinha sido explicitamente reconhecido por Georg Lukács: «Com efeito, embora não o admitamos, suponhamos que a investigação contemporânea demonstrou a inexactidão «de facto» de cada afirmação isolada de Marx. Um marxista ortodoxo sério poderia reconhecer incondicionalmente todos estes novos resultados, rejeitar todas as teses isoladas de Marx, sem por isso, por um só momento, se ver forçado a renunciar à sua ortodoxia marxista. O marxismo ortodoxo não significa, pois, uma adesão sem crítica aos resultados da pesquisa de Marx, não significa uma «fé» numa ou noutra tese, nem a exegese de um livro «sagrado». A ortodoxia em matéria de marxismo refere-se, pelo contrário, e exclusivamente, ao método»
[19].
O impacto da barbárie fascista, a monstruosidade da Segunda Guerra Mundial, o totalitarismo estalinista e a integração social das classes trabalhadoras na sociedade estabelecida conduziram Horkheimer e Adorno, bem como Marcuse, a empreender uma «revisão» das pretensões e das aspirações iniciais da teoria crítica. Na década de 40, toma corpo, portanto, uma verdadeira autocrítica da razão — a radicalização da crítica, a qual possui a forma de uma crítica radical da concepção moderna da racionalidade. O esforço filosófico vira-se contra a aceitação dogmática da dominação da natureza e passa à recusa rigorosa do pensamento da subjugação do meio natural
[20]. A crença ingénua na razão cede o seu lugar a uma reflexão profunda sobre «a autodestruição do esclarecimento»[21]. O espírito da liberdade, da justiça, da verdade e dos ideais do Iluminismo e da Revolução Francesa gerou, contra as suas próprias intenções, a aberração do «mundo totalmente administrado», que ameaça conquistar todas as sociedades, a menos que o esclarecimento acolha dentro de si mesmo «a reflexão sobre esse elemento regressivo»[22]. A dialéctica em que a razão e o esclarecimento incidem é a da regressão. Com o fascismo e a cultura de massas, «o progresso converte-se em regressão»[23]. A filosofia da história inerente à teoria crítica desde os seus começos ascende ao primeiro plano — a racionalidade aparece entrelaçada não só com a realidade social presente, mas também com a dominação da natureza.
A evolução da racionalidade na Idade Moderna é vista por Adorno e Horkheimer, no fundo, como um empobrecimento da razão, a qual se vê envolvida numa caminhada rumo à sua redução ao entendimento técnico e instrumental. A característica decisiva desta instrumentalização da razão — em que o pensamento é rebaixado a um simples meio ao serviço de iniciativas que podem ser boas ou más — é o seu uso segundo um método rigoroso, conduzindo a um crescente sistema — cada vez mais minucioso e aperfeiçoado — de conhecimento objectivante. A liquidação da razão, sobretudo no século XX, está, inclusive, em contradição com as aspirações e os ideias dos grandes pensadores da própria emancipação moderna nos séculos XVII e XVIII. Horkheimer caracteriza essa esterilização da racionalidade nas seguintes palavras:

«Justiça, igualdade, felicidade, tolerância, todos os conceitos que, como já foi mencionado, nos séculos precedentes eram inerentes à razão ou por ela deviam ser sancionados perderam as suas raízes espirituais. Eles ainda são objectivos e fins, porém não há nenhuma instância racional que esteja habilitada a atribuir-lhes um valor e a uni-los a uma realidade objectiva. (...) Quem pode afirmar que qualquer um destes ideais está mais estreitamente relacionado com a verdade do que seu contrário? (...) A constatação de que a justiça e a liberdade em si mesmas são melhor do que a injustiça e a opressão é cientificamente não-verificável e inútil. Em si ela soa entrementes exactamente tão sem sentido quanto a constatação de que o vermelho é mais bonito que o azul ou de que um ovo é melhor que o leite»
[24].

É precisamente essa concepção instrumental da razão que governa e regula as relações do homem com a natureza física. Neste sentido, a Nova Atlantida de Francis Bacon é a primeira grande utopia técnica dos Tempos Modernos, que antecipa e retracta o optimismo técnico-científico associado à representação de um regnum hominis neste mundo, espírito que já manifesta, aí, a face de subjugação da natureza que ainda estava por vir. Com o desaparecimento gradativo dos conceitos qualitativos de natureza ao longo do século XVII, o conhecimento sobre o mundo físico passa definitivamente para o plano do que é matematicamente construído, do que é exacto.
A ciência moderna nasce sob a égide do lema de Bacon: «saber é poder» — lema directamente voltado para um projecto de dominação da natureza, seja da natureza «fora de nós» ou ao nosso redor (natureza exterior), seja da natureza «em nós» (como contenção das paixões, dos sentimentos, dos desejos e como afastamento das «ilusões dos sentidos»). O próprio uso exacto da razão não é, portanto, um fim em si mesmo, e sim igualmente um meio de acesso ao que rege os fenómenos naturais, condição fundamental de possibilidade para a sua exploração e dominação. A tese de Adorno e Horkheimer desenvolvida minuciosamente na sua obra Dialéctica do Esclarecimento é neste ponto inequívoca: «O que os homens querem aprender da natureza é a utilizá-la, de modo a dominá-la plenamente, bem como a dominar os próprios homens. Além disso, nada mais importa»
[25]. Isto significa que, tanto do ponto de vista dos seus fundamentos científicos e metodológicos, quanto sob o prisma dos seus propósitos e finalidades, a técnica moderna manifesta um profundo estranhamento em relação à natureza. Cada intervenção técnica, dentro desse espírito, pressupõe uma postura básica de distanciamento e de oposição ao que é, tal como é.
Essa concepção da técnica herda o carácter instrumental, progressivamente imposto, da racionalidade moderna de modo geral, tal como tinha sido apreendida por Max Weber, tornando-se, tomada como meio ou instrumento, representação corriqueira da relação do homem com o ambiente na era em que, tanto ela como a ciência, são, desde a esfera da vida quotidiana, glorificadas como veículo automático de progresso. Assim compreendida, a técnica encontra-se às voltas com uma profunda vontade de apropriação, de assenhoreamento. Este projecto de dominação da natureza vincula-se intimamente a aspectos como a matematização do saber, o conceito de construção do objeto pelo sujeito investigador, o cálculo exacto que interpela a natureza segundo instruções precisas de expectativas acerca de um determinado rendimento, de imperativos de produtividade. Que o ser exacto ou certo não esgota, no entanto, o ser verdadeiro é uma objecção levantada não só por Adorno, Horkheimer e Marcuse, mas por outros pensadores na contemporaneidade, em particular por Martin Heidegger
[26] e por Ernst Bloch[27]. Como escreve Adorno:

«O conceito de progresso é filosófico na medida em que, enquanto articula o movimento social, ao mesmo tempo se lhe contrapõe. Surgido socialmente, ele reclama uma confrontação crítica com a sociedade real. O momento da redenção, por mais secularizado que seja, não pode ser apagado dele. O facto de que não se deixe reduzir nem à facticidade nem à ideia demonstra a sua contradição interna. Pois o momento do esclarecimento, na medida em que se consuma na reconciliação com a natureza ao acalmar os sustos desta, está irmanado ao momento de domínio da mesma. Modelo de progresso, ainda que seja transferido para a divindade, é o controle da natureza externa e interna do homem. A opressão exercida mediante esse controle, cuja suprema forma de reflexão espiritual está no princípio de identidade da razão, reproduz o antagonismo. Quanto maior identidade impõe o espírito dominador, tanto mais injustiça sofre o não-idêntico. A injustiça transmite-se por essa resistência. Ela reforça o princípio opressor, enquanto o oprimido também se arrasta peçonhento. Tudo progride no todo; só não o faz até hoje o todo mesmo»
[28].

A natureza, considerada na óptica da racionalidade instrumental, é apenas a totalidade de meros objectos: quer dizer que a crítica substancial da racionalidade moderna tem de conceder particular importância à vinculação que há entre a face da dominação da natureza e o agir humano voltado para fins, teleologicamente dirigido, de forma geral. Neste quadro, a normatividade do princípio da autoconservação hipertrofiou-se, autonomizando-se até se tornar essa hipóstase inescrupulosa no interior do projeto universal da lógica da reprodução do capital. A obviedade absolutizada da autoconservação — paradoxalmente contemporânea, na sua emergência, dos filósofos da liberdade dos séculos XVII e XVIII — desembocou historicamente, na era das sociedades massificadas, em resignação, em submissão automática como significando liberdade. São, por conseguinte, dois momentos inseparáveis de um mesmo movimento: por um lado, a entronização da autoconservação pelos agentes humanos à custa do menosprezo ou do sacrifício de diversos outros fins possíveis e plausíveis para a acção humana; por outro lado, o desnudamento da natureza de todo e qualquer valor e sentido internos, próprios, no processo que a depura de toda relevância religiosa, estética e, até mesmo, ética.
O alto preço pago pela afirmação racional de si é manter-se refreada a natureza em si próprio, em cada subjectividade humana individual: «O homem compartilha, no processo de sua emancipação, o destino do resto do seu mundo. A dominação da natureza envolve a dominação do próprio homem. Cada sujeito tem de participar não só da subjugação da natureza exterior, seja ela humana ou inumana, como tem, para realizar isto, de reprimir a natureza em si mesmo»
[29]. Renunciar ao presente, ao usufruto do imediato, torna-se imprescindível para a persecução do fim estabelecido. A ascese exigida e envolvida no gigantesco empreendimento social de autoconservação nem sequer é igualmente distribuída por todos.
A crítica da dominação da natureza, levada a cabo por Horkheimer e Adorno, é uma dimensão central da sua filosofia da história. Na Dialéctica do esclarecimento, percebe-se nitidamente o carácter auto-destrutivo dessa dialéctica: a razão está condenada a gerar desrazão; este é o traço essencial da história do processo civilizacional. A contradição fundamental da intenção esclarecedora é de que a liberdade parece produzir-se apenas por meio da dominação — da natureza e do próprio homem. O destino do esclarecimento ao longo do tempo parece ser o de resolver problemas criando novos problemas na própria sequência da sua solução. Horkheimer vislumbra apenas uma «saída»: «[...] Somos herdeiros, para o melhor ou pior, do Iluminismo e do progresso tecnológico. Opor-se aos mesmos por um regresso a estágios mais primitivos [de desenvolvimento social] não alivia a crise permanente que deles resultou. Pelo contrário, tais expedientes conduzem-nos do que é historicamente racional às formas mais horrendamente bárbaras de dominação social. O único meio de auxiliar a natureza é libertar o seu pretenso opositor, o pensamento independente»
[30].
Na Dialéctica do Esclarecimento, Horkheimer e Adorno concluíram que não havia outra cura para as feridas do Iluminismo senão o próprio Iluminismo radicalizado. A crítica da razão de Adorno e Horkheimer não se obscurece numa renúncia ao que a grande tradição filosófica e, em particular, o Iluminismo, pretendia, mesmo inutilmente, seguir: o conceito de razão. Como Nietzsche, ambos radicalizaram a crítica da razão ao ponto da auto-referencialidade, ou seja, até que essa crítica comece a minar os seus próprios fundamentos. Mas, ao contrário dos seguidores de Nietzsche — Martin Heidegger e Michel Foucault, Adorno deseja manter-se na contradição preformativa de uma dialéctica negativa
[31], que dirige o meio inevitável do pensamento identificador e objectivador contra si mesmo. Pelo exercício da resistência, Adorno convenceu-se de ter permanecido fiel a uma razão perdida no instrumental. Esta razão esquecida, pertencente à pré-história, só encontra eco nos poderes de um mimetismo sem palavras. Embora possa ser circundado pela dialéctica negativa, o mimético não pode ser revelado. O mimético permite o não reconhecimento de uma estrutura que pudesse ser caracterizada como racional. Adorno não apela por uma estrutura heterogénea à razão instrumental, com a qual a força da racionalidade intencional totalizada pudesse colidir. Só a arte guarda a promessa de reconciliação[32].

2. A pedagogia crítica, tal como tem sido elaborada nos Estados Unidos, nas suas diversas orientações e vertentes teóricas, mostra pouca familiaridade com a história dogmática da teoria crítica: os fundadores raramente são nomeados a partir dos seus próprios textos. Este lapso dos textos fundadores esvazia a teoria crítica da sua negatividade essencial.
As escolas reproduzem desigualdade e injustiça: este é o núcleo consensual da teoria crítica da educação. De resto, verifica-se que os teóricos críticos da educação diferem em muitos pontos da sua análise. Contudo, esta diversidade de perspectivas e de análises não quebrou a unidade da teoria crítica no que diz respeito às suas intenções: fortalecer aqueles indivíduos destituídos de poder e transformar/transcender as desigualdades e as injustiças sociais existentes. Neste sentido, os novos teóricos críticos permanecem fiéis às palavras de Horkheimer:

«A vida da maioria das pessoas é tão miserável, as privações e as humilhações são tão inúmeras, os esforços e os sucessos encontram-se, na sua maioria, numa discrepância tão flagrante que é por demais compreensível a esperança de que esta ordem terrena não seja a única verdadeira. [...] Se do desejo de felicidade, frustrado pela vida real até à morte, somente nasce no fim a esperança, a mudança das circunstâncias que condicionam o infortúnio poderia tornar-se uma meta do pensamento materialista»
[33].

Desde a sua formulação inicial por Horkheimer até aos novos teóricos críticos, a teoria crítica interpreta-se a si própria como «o lado teórico dos esforços para erradicar a miséria existente»
[34].
A teoria crítica, neste hora de ofuscamento total, é forçada a encarar-se a si mesma como uma praxis, não tanto política mas sobretudo pedagógica, e, como tal, procura infiltrar-se nos interstícios não colonizados da escola, na tentativa de fornecer orientação aos professores e aos alunos, levando-os a reconhecerem dentro de si mesmos a presença de um hóspede que não foi convidado: o opressor. Educar para a libertação: eis o lema da teoria crítica da educação.
O défice político da actual teoria crítica é — deste modo — compensado por uma prática pedagógica «empenhada»: o pensamento independente luta contra a sua própria integração e, só mediante o «sucesso» desta luta permanente, pode conservar a esperança de contribuir para a mudança social qualitativa. A sua revolução é a revolução molecular: a preparação da subjectividade rebelde para a tarefa da Grande Recusa. O empenhamento político congela o pensamento que devia realizar: a teoria crítica recusa toda a praxis que a congele; ela é a sua própria praxis que se mantém viva enquanto salvaguarda a sua independência. As pedagogias críticas que abraçam levianamente uma tendência partidária correm o risco de serem absorvidas por aquilo contra o qual lutam: a inércia conservadora do sistema educacional reificado. A guerrilha institucional é inimiga da liberdade: a violência, mesmo quando exercida em nome da pacificação da vida social, nunca é legítima. O argumento da legitimidade da violência não tem qualquer legitimidade diante da violência consumada. A memória de Auschwitz ainda permanece viva naqueles que não desejam a sua repetição. A política totalitária é a consumação da estratégia conceptual: a violência do conceito realiza-se na violência real. A identidade é sempre falsa: viola o não-idêntico que resiste à integração.

3. A nossa perspectiva da teoria crítica da educação inspira-se basicamente em perspectivas radicais exemplificadas nos trabalhos de teóricos como Paulo Freire, Henry Giroux, Peter McLaren, Michael W. Apple e S. Aronowitz. A pedagogia do oprimido de Paulo Freire continua, no entanto, a ser o modelo crítico que mais se aproxima das intenções de uma teoria crítica da educação. Mesmo quando abraça a linguagem existencialista, bem como o seu estilo de pensar, não deixa de ser uma pedagogia dialéctica, na medida em que medeia constantemente os opostos em função da sua possível reconciliação. De certo modo, «corporifica» o pensamento de Adorno, despindo-o do seu preconceito «elitista».
Confrontando-se com as diversas problemáticas administrativas da educação e com o sistema de ensino tal como este vigora nas sociedades modernas, a teoria crítica da educação trabalha a sua própria diferença, ao mesmo tempo que reclama a exclusividade. Partindo do pressuposto, empiricamente irrefutável, de que os homens são seres não livres que habitam um mundo repleto de contradições e assimetrias de poder, a teoria crítica da educação propõe modelos dialécticos que reconhecem o conceito de sociedade como relação mediada e mediadora entre indivíduos isolados. A sociedade não é um mero aglomerado de indivíduos, nem é algo absolutamente autónomo situado fora dos indivíduos, mas possui em si mesma simultaneamente os dois momentos. A sociedade realiza-se através dos indivíduos, mas, enquanto relação, não pode reduzir-se a eles. Os indivíduos realizam-se através da sociedade, mas, enquanto entidades isoladas, não podem constituir a sociedade. Esta compreende uma certa interacção entre os indivíduos e uma objectividade que os enfrenta de modo autónomo. A dialéctica da sociedade tenta reconstituir a experiência que nos é denegada tanto pelo sistema social como pelas formas de consciência reificada. A sociedade é experiência: algo que encontramos imediatamente em nós e diante de nós e algo que reconhecemos como a condição dos problemas que podem ser criticados e subvertidos, de modo a que a experiência viva possa prevalecer sobre a experiência coisificada e endurecida. A totalidade social actual só une os indivíduos entre si mediante a sua «alienação». O indivíduo cria e é criado simultaneamente pelo universo social do qual faz parte. Os conceitos de indivíduo e de sociedade medeiam-se entre si e, por isso, não podem ser pensados independentemente um do outro. Como escreve Horkheimer:

«A individualidade é prejudicada quando cada homem decide cuidar de si mesmo. À medida que o homem comum se retira da participação nos assuntos políticos, a sociedade tende a regredir à lei da selva, que esmaga todos os vestígios da individualidade. O indivíduo absolutamente isolado foi sempre uma ilusão. As qualidades pessoais mais estimadas, tais como a independência, o desejo de liberdade, a simpatia e o senso de justiça, são virtudes tanto sociais como individuais. O indivíduo totalmente desenvolvido é a consumação de uma sociedade totalmente desenvolvida. A emancipação do indivíduo não é uma emancipação da sociedade, mas o resultado da libertação da sociedade da atomização. Uma atomização que pode atingir o cume nos períodos de colectivização e de cultura de massas»
[35].
A heteronomia predominante na sociedade de consumo liquida completamente a interioridade da subjectividade, transformando-a numa espécie de consciência feliz
[36], absolutamente massificada, apática e resignada diante do poder da sociedade administrada. Os indivíduos atomizados, no seu excesso de zelo para lograr a adaptação e a reacção imediata a situações pontuais, são impedidos de levar a cabo a conformação de um eu fixo — uma identidade subjectiva e objectivamente real, que não mude de situação em situação, em função dos papéis sociais desempenhados e socialmente atribuídos durante o longo processo de socialização primária e secundária. A escola transformou-se, ela mesma e com o empurrão da racionalidade administrativa, numa indústria cultural e, como esta, atrofia aquilo que devia ajudar a libertar: o poder da imaginação do indivíduo rebelde.
Diante deste cenário, a teoria crítica da educação não tem outra alternativa senão alertar os educadores, levando-os a ver a escola não simplesmente como um meio de sustentar, legitimar e reproduzir os interesses do sistema tecno-económico generalizado, dirigidos para a fabricação de indivíduos obedientes, dóceis e mal remunerados, mas também como um terreno cultural que confere poder ao estudante e promove a auto-transformação — ou seja, a tarefa de reconquistar a individualidade perdida no seio de um aglomerado de consumidores passivos e alterdirigidos pelo poderoso sistema das indústrias culturais. Esta visão da escola como instituição contraditória é a mais adequada para se cumprir a tarefa pedagógica — exaustivamente preconizada por Marcuse em diversas das suas obras — de fazer com que «a interioridade e a subjectividade venham a tornar-se o espaço interior e exterior da subversão da experiência, da emergência de outro universo»
[37].
A escola não escapa à mediação universal de todo o social através da sociedade: a crítica da escolarização é necessariamente a crítica da sociedade administrada e da sua economia política globalizada. A teoria crítica da educação confronta a realidade efectiva do ensino escolar (escolarização), no seu contexto histórico, com a sua promessa de realizar a formação cultural (educação), a fim de criticar a relação entre ambos e assim transcendê-los. A escolarização é fundamentalmente um modo de controle social, que procura produzir os indivíduos de que a sociedade precisa para se perpetuar no tempo, sem alterar a sua estruturação global. A educação tem o potencial de transformar/transcender a sociedade, mediante a transformação do estudante num sujeito activo e consciente comprometido com o crescimento do seu poder pessoal e social. A escolarização que não esteja ligada à luta por uma vida qualitativamente melhor e sem angústia para todos, através da construção de uma sociedade baseada em relações livres de coerção e na justiça social não responde à exigência dos seus princípios conceptuais. A escola integrada ensina sem educar. Pode, num determinada disciplina ideológica, ensinar a preencher um cheque, sem, no entanto, fornecer conhecimentos conceptuais e orientação histórica para aqueles que, no processo educativo, ainda ousam ter esperança — sobretudo, aqueles professores que ainda não perderam a esperança de voltar a educar e a formar alguns dos seus alunos, pelo menos, aqueles que resistem aos condicionalismos e constrangimentos do currículo oculto e da sua matriz: a ideologia dominante.
Neste sentido, Henry Giroux desenvolveu uma teoria do currículo, a qual articula uma teoria do interesse e uma teoria da experiência
[38]. A teoria do interesse explicita o modo como o currículo reflecte os interesses da ordem estabelecida: as visões particulares do mundo que representam e as relações sociais que glorificam ou descartam. A teoria da experiência mostra que o currículo é uma narrativa historicamente construída que produz e organiza as experiências do estudante no contexto de formas sociais fetichizadas, tal como o uso da linguagem, a organização do conhecimento em categorias de alto e baixo status e a afirmação de tipos particulares de estratégias de ensino. O currículo configura os interesses e as experiências particulares, em função dos imperativos do crescimento económico contínuo. O currículo oculto que se insinua na prática diária pedagógica é consciência reificada. A linguagem pedagógica administrativa é sedimento do pensamento único. A consciência colonizada é consciência coisificada que, incapaz de problematizar, se deixa pensar pelo opressor. Pura heteronomia! O consenso obtido na e pela linguagem ordinária é a vitória do opressor. A linguagem vulgar silencia a voz do oprimido: nela o oprimido vê-se a si mesmo com os olhos do opressor. «A terapia linguística — isto é, o esforço rumo a palavras (e assim conceitos) livres de tudo, sem distorção do seu significado pelo establishment — postula a transferência de standards morais (e da sua validade) do establishment para a revolta contra ele»[39]. A linguagem do opressor deve ser radicalmente remodelada e extirpada da sua falsa neutralidade: uma tal linguagem, metódica e provocatoriamente «moralizada» em termos de recusa poderia e pode efectivamente não só confirmar as vozes dos professores e dos estudantes, mas também associar o propósito da escolarização a uma visão transformadora do futuro. Dar a palavra ao oprimido é renovar e recriar uma nova linguagem: a que nomeia as coisas pelo seu verdadeiro nome.
O professor que abandone a investigação fundamental depois de ter obtido o diploma de licenciatura ou qualquer outro grau académico mais avançado, na maior parte das vezes obtido de modo precipitado e demasiado fácil, deixa, por isso, de ser um professor empenhado e responsável e, mais cedo ou mais tarde, ingressa na categoria dos frustrados que consultam o psiquiatra para adormecer o seu vazio existencial. Não está à altura da sua missão educativa. Pedagogia e investigação contínua foram sempre inseparáveis até que se criou a burocratização da arte de ensinar; a partir desse momento, os professores, bem como os alunos, foram aprisionados, condenados a não ter direito à palavra. A pedagogia administrativa monopoliza a palavra e, ao negá-la aos outros participantes do processo educativo, mais não pretende que silenciar o seu protesto — o protesto contra a invasão da consciência por parte dos inimigos do pensamento e da imaginação criadores. Comprometida irrevogavelmente com os humilhados e ofendidos, a pedagogia crítica é radicalmente revolucionária: sendo a História fundamentalmente um processo aberto, a libertação é um objectivo autêntico e um mundo radicalmente diferente pode tornar-se real, desde que as pessoas não tenham medo de se servir do seu entendimento para determinar racionalmente, em diálogo umas com as outras, os fins da sua acção.

4. A pedagogia crítica elaborou uma teoria radical da escolarização, desenvolvendo para o efeito novas categorias de investigação e novas metodologias. H. Giroux
[40] considera a escolarização como um empreendimento decididamente político e cultural. As escolas são vistas não somente como locais de instrução, mas também como arenas culturais onde uma heterogeneidade de formas ideológicas e sociais colidem frequentemente numa luta incessante pelo poder. Do primeiro ponto de vista, a escolarização desempenha — tal como demonstraram Louis Althusser[41] e, de modo mais empírico, Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron[42] — um papel fundamental no processo de reprodução social e cultural da sociedade estabelecida. Como escrevem Adorno e Horkheimer: «Poder e conhecimento são sinónimos»[43]. A descoberta dessa relação íntima entre conhecimento e poder ajuda o professor emancipado a usar esse conhecimento no desenvolvimento de cidadãos críticos e activos. A visão administrativa da instrução da sala de aula e aprendizagem como um processo neutro, anti-septicamente removido dos conceitos de poder, política, história e contexto, não pode mais ser dignamente defendida. De facto, a suposta abertura da escola ao meio esquece que a escola está sempre-já afundada na sociedade, da qual mais não é que um instrumento obediente de integração social e cultural. Como uma forma de política cultural[44], a escolarização representa sempre uma introdução, preparação e legitimação de formas particulares de vida social. Está sempre implicada em relações de poder, práticas sociais e formas de conhecimento que suportam uma visão específica do mundo: a do opressor. A indústria do conhecimento é de tal modo racionalizada que reproduz a falsa identidade e fragmenta as relações sociais democráticas através de uma ênfase na competitividade, na produtividade e na eficácia.
Tal como clarificaram as análises genealógicas do poder de Michel Foucault
[45], o poder político é uma abstracção castradora e convém ter isso presente quando se fala de poder, pelo menos no âmbito das pedagogias críticas. O Estado não corporifica todo o poder — o poder dá-se nas relações que estabelecemos com os outros, sobretudo com os mais próximos. São estes e não tanto os que estão mais distantes — ocupando funções administrativas, que ameaçam directamente a nossa existência nas suas possibilidades mais autênticas. O pedagogo crítico sabe muito bem que os seus inimigos não são tanto os quadros administrativos do Estado, mas sobretudo e fundamentalmente o grupo anónimo dos seus colegas. Esta turba de mediocridade é um inimigo com atributos quase divinos — omnipotente, omnipresente e omniconsciente, excepto omnigenerosa. A sua vigilância permanente faz sentir os seus efeitos de modo tanto mais forte quanto mais ousada for a atitude do professor crítico. O pensamento amedronta-a e, sobretudo, desmistifica a terrível ilusão em que vive mergulhada: não é fácil assumir-se como um usurpador do lugar que não lhe pertence quer por direito quer efectivamente. O professor colonizado, sobretudo quando tem consciência tética da sua mediocridade, só é movido por um interesse: impedir que os seus alunos conheçam outro professor digno desse nome e que façam a comparação e tirem as devidas conclusões! O professor colonizado é mais que um Velho do Restelo — é um vampiro que só vive à custa do sacrifício do outro. A sua resistência é a mais cruel com que se defronta a pedagogia crítica. Superá-la exige libertar os alunos da «pedagogia do atrasado mental» e convidá-los a ter uma nova experiência — a experiência antecipada da liberdade. A resistência dos alunos é menos organizada: uma metodologia centrada em problemas geradores[46] — associada evidentemente à competência científica do professor — é suficiente para render o opressor que há neles. Apesar do pensamento crítico ser um salto no abismo, vale a pena correr esse risco: quem arrisca sofre, mas só este sofrimento lhe permitirá experimentar a alegria — a alegria de estar vivo num mundo em que todos queriam que estivesse morto. Este é o único tipo de vingança que a subjectividade rebelde se permite. Ir mais longe que isso seria deixar-se aprisionar novamente no cárcere do opressor. Ser igual ao opressor é o que mais teme o indivíduo emancipado; a partir do momento em que se descobre como indivíduo autónomo, o seu maior medo é a loucura. A morte é preferível, na medida em que põe termo a uma existência sem lhe roubar a sua dignidade — de ter sido uma consciência que resistiu à heteronomia. A sua lembrança será guardada tanto por aqueles que ajudou a libertarem-se como por aqueles que a odiaram, porque estes últimos, depois da sua denúncia silenciosa, nunca mais poderão manter a sua anterior auto-imagem. Os mártires que morrem sozinhos são sempre lembrados como a boa consciência daqueles que a perderam. Ninguém que se descubra como medíocre, depois de se ter julgado expert, volta a acreditar em si mesmo: resta-lhe o silêncio ressentido que se alimenta de mil e uma vinganças — mas nenhuma delas, mesmo que bem sucedida, lhe permite reencontrar novamente o estado de ilusão anterior. A sua existência é culpa permanente. Se não se der por satisfeito, consultará o psiquiatra que, mediante um bom tratamento com anti-depressivos, depressa o anula como projecto de ser. O vencedor pode ser vencido, sobretudo quando se interna num hospital psiquiátrico, donde nunca devia ter saído.

5. Na sua discussão sobre pensamento crítico, a pedagogia administrada neutralizou o termo crítico, através do seu uso repetido e impreciso, removendo as suas dimensões políticas e culturais e eliminando o seu poder negativo para significar «habilidades de pensamento». O ensino é reduzido à sua função de ajudar os estudantes a adquirir níveis mais elevados de habilidades cognitivas, prestando-se pouca atenção ao propósito para o qual essas habilidades devem ser dirigidas. Os estudantes são encorajados a serem bem sucedidos no mundo árduo e competitivo do limitado mercado de trabalho.
Ao definir o sucesso académico em termos da criação de indivíduos submissos, produtivos e patriotas, as teorias administrativas da educação esquivam-se de qualquer preocupação pelos cidadãos educados, críticos e autónomos. Os estudantes são vistos unicamente como a vanguarda do crescimento económico contínuo. Os burocratas do ensino rejeitam a perspectiva de que as escolas deveriam ser locais para a transformação social e para a emancipação, lugares onde os estudantes são educados não somente para serem pensadores críticos, mas também para verem o mundo como um lugar onde as suas acções — em particular, as suas acções inter-comunicacionais — podem contribuir para a mudança social qualitativa.
A escola colonizada persegue sistematicamente a conhecimento emancipador: nela ensina-se uma prática cega, em vez de se fomentar uma iluminação dialéctica susceptível de orientar uma praxis da emancipação. O conhecimento emancipador é preterido em favor da obtenção de um diploma técnico, o qual está basicamente relacionado com a lógica do mercado. Contra este imperativo burocrático, a teoria crítica da educação empreendeu uma reconstrução socialmente crítica do que significa «ser escolarizado»
[47], salientando que qualquer prática pedagógica verdadeira exige um compromisso com a transformação social, em solidariedade com os oprimidos. A sua missão pedagógica é consciencializar as consciências imersas na coisificação e faze-las emergir para a tarefa da eliminação das condições que geram o sofrimento humano[48]. Os oprimidos que aceitam levar a cabo a sua libertação não são somente aqueles que vivem na privação material (os pobres), mas todos os indivíduos que ainda não emergiram da sociedade opressora. Quem diz que não pode saber mais porque a situação não o permite, não merece a atenção que se lhe dedica: as dificuldades materiais não respondem pela falta de conhecimento e, muito menos, pela inércia mental.

6. A afirmação dos burocratas do sistema de ensino de que as escolas funcionam como um mecanismo para o desenvolvimento e aprofundamento da democracia e da igualdade social é claramente desmentida pela realidade escolar efectiva. As escolas não oferecem oportunidades na vasta tradição ocidental para a capacitação pessoal e social e, na realidade, trabalham frequentemente contra essas oportunidades. As vítimas desse processo são, desde logo, os próprios professores. A adopção crescente de pedagogias administrativas e de esquemas de contabilidade para satisfazer a lógica das exigências do mercado promove activamente a incapacidade dos professores. A proliferação de currículos adoptados pelo Estado, que — como se diz correntemente — são «à prova de professores», revela claramente que estes não participam, de um modo responsável e digno, na elaboração das propostas de programas e, muito menos, na sua escolha. H. Giroux
[49] verifica que o papel do professor é efectivamente equiparado ao de um secretário não capacitado e mal-remunerado. Nas escolas administradas, o aperfeiçoamento da democracia é mantido zelosamente num estado de hibernação: o opressor governa a escola em todas as suas esferas como se fosse um representante legítimo daqueles que democraticamente silencia, obrigando-os a cumprir e a executar as suas ordens.
A necessidade escolar de planificação reprime a liberdade e a formação intelectuais. Defender o pensamento independente é resistir à inércia administrativa dos Programas e das Planificações impostos de cima — exterior e heteronomamente; é dignificar o professor, o aluno e a escola, na sua capacidade autónoma de decidir o que é mais adequado para si mesmos e para os outros, em função da natureza das situações sociais com que se deparam diariamente e da análise racional que fazem das mesmas. A autonomia conquista-se vencendo o «medo à liberdade»
[50] e assumindo, nesse acto, a tarefa de recuperar a subjectividade rebelde esquecida no fundo da sua consciência: a única que os pode proteger da estupidificação em curso. A invasão do ensino por parte do sistema burocrático demite os professores da sua missão de educar e estes, não satisfeitos com a sua demissão, auto-demitem-se quando se refugiam nas visitas de estudo[51] e nos projectos da área escola, de resto previstos pelos planos administrativos, sob a alegação de que a educação passa também pela distracção. Ao pretender invadir o espaço exterior a si mesma, como se se tratasse de uma esfera com vida e legalidade próprias, a escola, sem disso tomar consciência, deixa-se invadir passivamente pela sociedade administrada: a visita de estudo revela-se como instalação definitiva e castradora da sociedade que supostamente pretende invadir. A escola não tem um exterior a si mesma, na medida em que ela própria é esse exterior. O seu isolamento não se afirma frente à sociedade, mas frente à crítica. Por detrás de cada uma das suas decisões supostamente autónomas, sobretudo no caso das visitas de estudo, insinua-se claramente a presença potente da planificação centralizada. As motivações que secretamente as movem reduzem-se, afinal, à planificação de um potencial encontro sexual. A planificação do sexo desenrola-se no âmbito da planificação escolar centralizada. Aqui a planificação mostra o seu verdadeiro rosto: o processo de debilitação do eu leva-o a procurar fora de si mesmo aquilo que só a ele lhe pertence e que só nele próprio pode encontrar. A promiscuidade sexual[52] é afinal a única distracção disponível, já que «a falta de fantasia, implantada e insistentemente recomendada pela sociedade, deixa as pessoas desamparadas no seu tempo livre»[53]. Nela o eu débil afunda-se «livremente» nos outros, sem se aperceber o quanto não é livre aí onde mais livre se sente — no comércio anónimo do sexo ocasional —, «porque a regra de tal ausência de liberdade foi abstraída»[54] dele. A liberdade organizada é falsa liberdade. Até mesmo como fuga às rotinas escolares as visitas de estudo e as actividades extra-curriculares não deixam de ser prolongamentos de actividades accionadas e organizadas pelo sistema administrativo escolar. A afinidade entre a escola e a diversão mostra-se assim no seu próprio sentido: a apologia da sociedade que a isola cada vez mais da crítica redentora, na medida em que, como demonstraram Adorno e Horkheimer, «divertir-se significa estar de acordo» e estar de acordo significa, por sua vez, «não ter que pensar nisso, esquecer o sofrimento até mesmo onde ele é mostrado. A impotência é a sua própria base. É, na verdade, uma fuga, mas não, como afirma, uma fuga da realidade perversa, mas da última ideia de resistência que essa realidade ainda deixa subsistir. A libertação prometida pela diversão é a libertação do pensamento como negação»[55] da sociedade opressora. O chamado «professor fixe», bem como a sua «pedagogia do gajo porreiro», é cúmplice passivo desta estratégia de manter todos os indivíduos na dependência pueril do sistema administrativo. A puerilidade[56] é, pois, um estado contínuo de dependência, no qual se substitui a dependência materna pela dependência social administrada, quando não se consegue, por alguma razão fatídica, conservar as duas dependências em simultâneo. Os que negam a conquistar a sua autonomia nunca terão acesso à experiência genuína do tempo livre produtivo. Sob o domínio da heteronomia, tornam-se heterónomos também para si próprios.
Até mesmo a suposição de que as escolas funcionam como os principais promotores da mobilidade social e económica é falsa, tal como demonstrou Michael Apple
[57]. A escolarização não oferece oportunidades a um grande número de estudantes para se tornarem capazes como cidadãos críticos e activos. O facto dos filhos dos trabalhadores poderem tirar um curso superior e ascenderem a um camada social (supostamente) superior não implica mobilidade social e cultural e, muito menos, mobilidade vertical. Diante da sociedade todos são consumidores, não só de bens de consumo, mas também de ideias esvaziadas do seu conteúdo cognitivo e, por isso, tornadas equivalentes. Todos são iguais na sua incapacidade de pensar para além da realidade opressora, na medida em que partilham a mesma cultura: a cultura comercializada. A neutralização da oposição ameaça desvirtuar irreversivelmente a essência da democracia. O sistema cinzento é o único que efectivamente governa, deixando o elemento feminino predominante «à beira de um ataque de nervos». A pedagogia transforma-se fatalmente em intriga e em «guerras de poder», cujos objectivos escapam a qualquer tentativa de compreensão racional[58], a não ser a uma interpretação psiquiátrica.
Se, como afirmou Adorno, «a chave de uma mudança profunda reside na sociedade e na sua relação com a escola»
[59], então somos confrontados com uma dupla tarefa: a escola que devia contribuir para a mudança social qualitativa precisa, ela mesma, ser transformada e preparada antes de poder assumir a sua verdadeira missão. A escola oscila, nas actuais circunstâncias, entre a perpetuação da barbárie, enquanto mecanismo de reprodução da sociedade repressiva, e o combate contra a barbárie, enquanto instituição empenhada na formação cultural. Consciente dessa ambiguidade essencial da escola, Adorno não deixa de fazer um apelo, no sentido de convencer os professores a libertarem-se dos tabus que os impedem de educar:

«A barbárie é um estado no qual todas essas formações às quais serve a escola se mostram fracassadas. Por certo que, enquanto a sociedade engendre de si mesma a barbárie, a escola não será capaz de se opor a esta mais que em grau mínimo. Mas se a barbárie, a terrível sombra que se abate sobre a nossa existência, é precisamente o contrário da formação, também é algo de essencial que os indivíduos sejam desbarbarizados. A desbarbarização da humanidade é a pré-condição imediata da sua sobrevivência. A esta deve servir a escola, por limitados que sejam o seu âmbito de influência e as suas possibilidades e, para isso, necessita libertar-se dos tabus, sob cuja pressão a barbárie se reproduz. O pathos da escola — hoje a sua seriedade moral —, nas presentes circunstâncias, reside em que, somente ela, se é consciente da situação, é capaz de trabalhar imediatamente pela desbarbarização da humanidade. Por barbárie, não entendo os Beatles, embora o seu culto faça parte dela, mas sim o extremo: o preconceito delirante, a repressão, o genocídio e a tortura; aqui não há lugar para dúvidas. Opor-se a isso, tal como se nos oferece o mundo de hoje, onde pelo menos não é possível vislumbrar nenhuma outra possibilidade de mais amplo alcance, compete antes de mais nada à escola. Daí que, a despeito de todos os argumentos teórico-sociais contrários, seja tão importante desde o ponto de vista social que a escola cumpra a sua missão. E, para isso, ajuda a tomada de consciência da fatídica herança de representações que pesa sobre ela»
[60].

7. Ao denunciar a definição oficial das escolas como instituições democráticas, a teoria crítica da educação revela as maneiras pelas quais o currículo escolar, o conhecimento e os métodos dependem da expansão destrutiva da economia de mercado generalizada. O objectivo é desmistificar a desigualdade de interesses sociais e pessoais competitivos dentro da ordem social que proíbe a igualdade de oportunidades. Nenhuma decisão pode ser tomada desinteressadamente e nenhuma prática educacional — seja ela centrada na questão da excelência, avaliação ou contabilidade — é independente dos contextos social, económico, cultural, histórico e institucional nos quais a escolarização acontece. A escolarização só pode ser analisada como um processo cultural e histórico, no qual os indivíduos são posicionados dentro de relações assimétricas de poder em função de agrupamentos sociais específicos. Os professores emancipados recusam a tarefa a eles prescrita pelo capitalismo, como intelectuais, professores e teóricos sociais, de servir passivamente as disposições ideológicas e institucionais existentes nas escolas. As escolas servem sempre os interesses do opressor, enquanto desconfirmam simultaneamente os valores e habilidades dos oprimidos. Independentemente da sua coloração partidária, a escolarização administrativa apoia sempre uma tendência inerentemente injusta, resultando na transmissão e na reprodução da cultura comercializada do status quo.
A tentativa de transformar a educação requer, por conseguinte, a rejeição da ênfase no prognóstico e dimensão científicos, que têm sido tacticamente instalados nos modelos de planificação do currículo e noutros métodos teóricos recomendados para a prática educacional. A teoria crítica da educação desafia o relacionamento frequentemente incontestável entre escola e sociedade, desmascarando o apelo da pedagogia administrada de que a escola possibilita igualdade de oportunidades e oferece acesso à democracia igualitária e ao pensamento crítico. A escolarização não constitui um processo apolítico e neutro. Na verdade, afirmar que escolas são instituições meritocráticas é uma tautologia conceptual: os alunos bem sucedidos são aqueles a quem as escolas recompensam, não por causa do seu mérito individual, mas por causa da vantagem do dinheiro e do status social. A pedagogia crítica tenta oferecer aos professores e pesquisadores um meio de melhor entender o papel que as escolas, de facto, representam dentro de uma sociedade dilacerada por contradições sociais, e, neste esforço, produz conceitos para questionar as experiências dos estudantes, os textos, as ideologias dos professores e aspectos do método escolar, que as análises administrativas omitem sistematicamente. De facto, a pedagogia crítica tem definido com precisão as dimensões políticas da escolarização, mostrando que as escolas operam principalmente para reproduzir os valores e privilégios do opressor. A pedagogia crítica compromete-se com formas de aprendizagem e acção empreendidas em solidariedade com os indivíduos que desejam libertar-se do opressor. Problematizar os conceitos estabelecidos sobre a escolarização é dedicar-se ao imperativo emancipatório de conferir poder ao indivíduo e de transformação social.

8. A teoria crítica da educação procura incorporar-se na prática educacional. Desafiando os burocratas do ensino, que desejam que as escolas ensinem simplesmente os estudantes sobre a grande herança cultural, almeja fornecer aos professores conceitos críticos, que lhes possibilitarão analisar as escolas como lugares que produzem e transmitem práticas sociais que reflectem os imperativos ideológicos e materiais da cultura dominante. Pensar é aquilo que não se faz numa sala de aula, cujo professor seja um profissional do ensino tecnológico zeloso do seu título. Pensar é esquecer-se de si mesmo e entregar-se ao fascínio das ideias e dos conceitos. Quem, quando pensa, reivindica nesse acto o privilégio do seu umbigo, não pensa: a sua preocupação imediata é a auto-preservação. O pensamento verdadeiro transcende o seu contexto de produção, bem como os interesses imediatos daquele que o exteriorizou pela primeira vez. O pensamento só é verdadeiro quando escapa à relatividade do seu contexto de produção: o pensamento que permanece prisioneiro do contexto é ideologia — pura apatia diante da crueldade existente.
Quem tem pretensões intelectuais tem que as justificar perante os outros: a cultura não admite a irresponsabilidade. Todos os professores têm responsabilidades não somente pela maneira como agem individualmente em sociedade, mas também pelo sistema no qual participam. Os teóricos críticos tentam «relativizar» as escolas como agências que legitimam essencialmente relações e práticas sociais existentes, tornando-as normais e naturais, desmembrando e reorganizando as regras e os códigos artificiais que compõem a realidade na sala de aula. Atacam as perspectivas familiares, perturbadoramente comuns e tentam ir além da questão convencional sobre o que significa a escolarização, levantando, em vez disso, a questão mais importante sobre como a escolarização chegou a ter esse significado. O resultado é que as escolas — frequentemente vistas como agências socializadoras que ajudam a sociedade a produzir cidadãos inteligentes, responsáveis, comprometidos e preparados — tornam-se instituições estranhas e perturbadoras, que não somente ensinam sujeitos, mas também produzem seres humanos incapazes de reflexão e que, nas suas actividades diárias, representam as ideologias da cultura dominante. A escola como agência de socialização integrada coisifica os alunos, em vez de os transformar em sujeitos conscientes e autónomos capazes de se libertarem da reificação.
A teoria crítica da educação permanece fiel à crítica do sistema capitalista: o seu padrão de exploração e de expansão produziu uma racionalidade económica — a racionalidade instrumental — que influencia o pensamento actual sobre temas sociais e educacionais e continua a contribuir para a geração de gravíssimos problemas sociais. Para assegurar que todos os indivíduos tenham uma voz no valor excedente que o seu trabalho produz, a teoria crítica insiste que os responsáveis pelo tipo actual de capitalismo devem ser considerados moralmente responsáveis. É necessária uma nova ética económica que ajude a guiar e, eventualmente, a reformular o sistema económico no interesse de todos, uma ética com a visão e o poder de contrariar os efeitos desumanos do capitalismo global e generalizado.
Sob o efeito todo-poderoso do princípio de troca, a escola silencia o não-idêntico, reproduzindo continuamente, qual fábrica de produção industrial, a falsa identidade da sociedade repressiva a que se devia opor como defensora da diferença. Matando as almas, a escola reproduz corpos idênticos uns aos outros e — o que é ainda pior — felizes por puderem ser abastecidos em qualquer grande área comercial. O corpo converte-se em carne digerível por qualquer outro instrumento. A cultura integrada converteu-se numa imensa cadeia alimentar: as mentes anestesiadas entregam-se facilmente — a si mesmas enquanto corpos colonizados — ao consumo em massa. A cultura como alimento digerível democraticamente é cultura tóxica: o corpo engorda enquanto a mente se atrofia. A obesidade é uma figura do pensamento colonizado: as toxinas do invasor invadem o corpo do hospedeiro, de modo a colocá-lo ao serviço da reprodução social. Pensamento gordo = pensamento domesticado
[61] = pensamento colonizado = pensamento do opressor = pensamento único = pensamento passivo. O empirismo foi sempre a filosofia do opressor.

9. A emergência filogenética da auto-consciência — da consciência de si mesmo como indivíduo — trouxe ao mundo, pela primeira vez, o sofrimento: o sofrimento resultante de uma existência vivida na solidão substancial
[62]. O indivíduo desde que nasce até que morre sabe, em cada momento crucial da sua vida, que está absolutamente sozinho num mundo que nunca é verdadeiramente o seu mundo, mas o mundo dos outros generalizados que, pelo facto de estarem-aí, negam a sua própria existência e todas as suas possibilidades. O outro generalizado é uma crueldade, porque nos nega como existência autêntica. Estamos sozinhos e condenados a sermos esquecidos por um universo sem memória. As garantias que temos, sobretudo o amor maternal, são efémeras: a morte rouba-as quando mais precisamos delas e a natureza, na sua evolução, não nos deu outras adaptações filogenéticas que nos protegessem desta situação quase-transcendental que é viver na solidão, sabendo que a estrela que nos acompanhou no nascimento abandona-nos na morte.
A natureza lançou-nos um desafio tremendo: sermos indivíduos auto-conscientes que precisamos dos outros para nos realizarmos até mesmo como indivíduos autónomos. A sociedade que, ao mesmo tempo, nos individualiza, socializa-nos. Mas a socialização, mesmo quando bem sucedida, não amortece o sofrimento da solidão. Este reaparece em toda a sua força nas situações-limite, quando temos de contar somente connosco mesmos. A subjectividade rebelde é uma subjectividade infeliz que persegue tenazmente a felicidade, embora reconheça a sua impotência para a alcançar sozinha. O pensamento crítico é uma actividade extremamente solitária. Mediante o seu exercício, a consciência mergulha em si mesma, sabendo que todo o seu esforço autêntico pode ser gratuito, tanto para si mesma como para os outros que resistem ao sofrimento resultante de estarem sozinhos num mundo absolutamente solitário. Nesta resistência ao diálogo encontra o pensamento crítico a sua impotência: a sua palavra — a palavra de uma consciência que procura alcançar o outro num esforço derradeiro de transcender a sua solidão — não é escutada pelo outro.
Diante deste sofrimento quase metafísico qualquer tentativa de querer distinguir entre opressores e oprimidos torna-se demasiado supérflua: todos somos ao mesmo tempo opressores e oprimidos enquanto indivíduos que somos e, perante a sociedade, todos somos oprimidos. A sociedade estabelecida é um cárcere que consente alguma liberdade de movimento: como vimos, a individualidade só pode surgir no seio de uma sociedade, de preferência urbana, por mais opressora que ela possa ser. A comunidade não deixa manifestar no seu bojo a individualidade e muito menos a individualidade rebelde, na medida em que a sua criação é um acto psico-pedagógico e social de exorcizar o exorcismo e, consequentemente, de libertar as forças rebeldes e, por isso mesmo, avessas à integração social, contra a tirania civilizacional e comunitária que, sob a designação de Super-Ego, as mantém aprisionadas naquela estrutura que Freud denominou de Id.
A pedagogia da resistência terá que começar por vencer a resistência de todos aqueles, tanto professores como alunos, que temem mergulhar na interioridade da sua subjectividade. A consciência feliz predominante prefere a ilusão da sua falsa felicidade à verdade da sua infelicidade essencial. Sair da caverna e olhar de frente a noite causa horror a qualquer indivíduo que se satisfaz com o comércio inautêntico com os outros. Descobrir a solidão instalada no interior da sua subjectividade encarnada é descobrir a vida no seu sofrimento mais profundo. E, no entanto, é nesta descoberta autêntica que reside o impulso para a libertação.

10. A escola como instituição colonizada afunda-se naquilo que devia denunciar e ajudar a transcender: a sociedade massificada. Ao criticar os fundamentos das diversas filosofias da educação, no fundo variações da pedagogia administrada, a teoria crítica da educação nada mais faz do que lançar os fundamentos de um novo projecto educativo.
Giroux tem toda a razão quando afirma que não basta denunciar a escola como uma agência da socialização integrada: a denúncia que se satisfaz consigo mesma é resignação. «As escolas são locais contraditórios»
[63]: há portanto espaço para levar a cabo a tarefa de libertar o futuro, de modo a que Auschwitz nunca mais se repita. Como vimos, uma compreensão crítica da escolarização permite-nos ver as escolas como locais de dominação e libertação. Deste modo, a teoria crítica da educação opõe-se ao cerne da teoria educacional administrativa, que concebe as escolas principalmente como provedoras de habilidades e atitudes necessárias para os estudantes se tornarem cidadãos patriotas, industriais e responsáveis. A escola deve converter-se numa instituição crítica, se quiser resistir às forças da integração social e cultural em curso na sociedade administrada. O modelo de escola predominante é um modelo burocratizado imposto de cima pelo Estado e pelos seus funcionários subservientes, sem que os principais agentes educativos tenham participado como sujeitos particulares e livres de coerção na sua elaboração ou mesmo na sua crítica racional e livre. Ivan Illich chamou-lhe instituição manipuladora[64] e Louis Althusser, analisando-o, no contexto da reprodução social das relações sociais de produção capitalistas, chamou-lhe Aparelho Ideológico de Estado[65], cuja função é preparar — mediante um trabalho de inculcação ideológica — os alunos para o desempenho dos papéis que lhes são socialmente atribuídos no processo de produção. A escola como instituição crítica opõe-se frontalmente à escola como instituição manipuladora. Em vez de preparar indivíduos dóceis, apáticos e resignados, a escola como instituição crítica quer romper com a atomização da sociedade administrada, de modo a abrir caminho à emergência de subjectividades rebeldes, capazes de se libertarem a si mesmas do processo de sujeição a que as submete-sujeita a ideologia dominante. A escola como instituição crítica deve fornecer os conceitos necessários ao aluno que se queira libertar da sujeição-submissão ideológica: a imuno-cognição crítica é a arma que os professores e os seus alunos devem erguer para se defenderem da comunicação distorcida imposta pela burocracia educacional e política dominante. Como instituição crítica, a escola deve reconquistar o espaço de libertação que coexiste no seio da escola burocratizada com o espaço da dominação. A teoria crítica da educação encara, tanto a escola no seu conjunto como as aulas que ocorrem no seu seio, como um fórum crítico e racional, onde professores e alunos se juntam para debater, entre eles na sala de aula e entre a escola e as restantes instituições sociais, os mais diversos assuntos, procurando sempre que possível um consenso racional. Professor e aluno devem reconstruir, em constante diálogo «horizontal» e liberto da coerção, a sua subjectividade, libertando-a do seu elemento estranho — a adesão ao opressor. O meio para essa confrontação é — conforme acentua Habermas[66] — o uso público da razão, articulado por indivíduos privados engajados numa discussão que é, em princípio, aberta e sem coerção. Só deste modo pode a escola constituir-se como o berço da subjectividade rebelde, imunizada e preparada para resistir às estupidificações da sociedade de consumo. A subjectividade rebelde é uma subjectividade que se recusa, mediante uma revolta permanente consigo mesma e com o mundo, a ser novamente colonizada pela ideologia do opressor. A mimesis cativante é o elemento da teoria crítica da educação.
A missão crítica da educação deve ser a autonomização dos indivíduos através de um processo educativo (relação e acção educativas) capaz de contribuir para o desenvolvimento da consciência crítica e para a emergência de uma sensibilidade não-mutilada. A reconciliação visada pela teoria crítica é, na actual conjuntura social, uma tarefa prática, da qual devem participar todos os intervenientes do processo educativo, sobretudo os professores quando encarados — segundo a expressão de Giroux — como intelectuais políticos
[67]. A sua mais nobre tarefa deverá ser ajudar os alunos a serem capazes de reflectir sobre a sua própria história, quer como indivíduos, quer como membros de sociedades mais vastas, e de usar essa reflexão justamente para alterar o curso barbarizante da história. Esta missão do educador crítico está ausente em todas as formas de teorias sociais e de teorias da educação — usualmente referidas como positivismo que tentam moldar as ciências sociais segundo os modelos das ciências naturais, tal como fazem, de resto, os programas impostos pelo Estado e suas agências de controlo social aos professores ou mesmo aos alunos. Ao reconhecer a auto-reflexão ou reflexividade dos agentes humanos, a teoria crítica da educação tem de reconhecer que uma sociedade emancipada seria aquela em que os seres humanos controlassem activamente os seus próprios destinos, através da crescente compreensão das circunstâncias em que vivem.
As indústrias culturais incutem nos estudantes uma paixão horrenda pela ignorância. Segundo Jacques Lacan
[68], a ignorância não é um estado passivo, mas um estado activo ou de exclusão da consciência. A paixão pela ignorância que infecta a cultura da imagem magificada deve-se a uma recusa em reconhecer que as nossas subjectividades foram construídas a partir das práticas sociais e das formas de consciência sociais coisificadas correspondentes que nos dominam. A ignorância incorporada na própria estrutura do conhecimento desafia a imaginação pedagógica de qualquer professor empenhado na emancipação dos seus alunos. Estes, incapazes de encontrar conhecimento significativo no mundo fetichista das mercadorias, recorrem à violência gratuita ou a uma neblina intelectual onde qualquer coisa mais desafiadora e provocante do que o noticiário nocturno é encarada com desprezo. Esta epidemia de anastesia conceptual só beneficia a cultura dominante.
É, por isso, que a escolarização deve ser um processo de compreensão de como as subjectividades são produzidas por processos sociais objectivos. A compreensão dos processos sociais pelos quais temos sido construídos é, desde logo, auto-transformadora. Se fomos feitos, então podemos ser desfeitos e refeitos. Os professores emancipados precisam encorajar os estudantes a serem autoreflexivos sobre a sua situação no mundo e a dotá-los, mediante metodologias adequadas aos diversos contextos, com estruturas conceptuais para que eles comecem a emergir da realidade opressora. Ensinar e aprender dever ser simultaneamente um processo de investigação e de crítica permanente e um processo de construção de uma imaginação social que trabalha dentro de uma linguagem da esperança. Se o ensino for visto como uma linguagem da possibilidade, a aprendizagem pode tornar-se facilmente relevante, crítica e transformadora. Segundo Giroux
[69], o conhecimento é:

— relevante somente quando começa com as experiências que os estudantes trazem consigo da cultura e do mundo da vida em que estão inseridos;
— crítico somente quando essas experiências são mostradas como sendo, algumas vezes, problemáticas;
— e transformador somente quando os estudantes começam a usar o conhecimento adquirido para ajudar a conferir poder aos outros, incluindo os indivíduos da sua comunidade.

O conhecimento crítico visa a reforma social
[70]. Mediante a reestruturação da linguagem do self procura-se ajudar o aluno a negociar melhor com o mundo que deve ser transformado, tendo em vista aquilo que Adorno chamou de «vida sem angústia».
Os professores que resistem à integração social devem criar agendas de possibilidade nas suas salas de aula. A pedagogia crítica não garante que a resistência, tanto dos alunos como dos professores, não aconteça, mas fornece aos professores as bases para a compreender e para que qualquer pedagogia desenvolvida seja sensível às condições socioculturais que constróem a resistência, diminuindo a possibilidade de que os estudantes sejam responsabilizados como a sua única fonte criadora. A pedagogia emancipatória não pode ser construída a partir de teorias do comportamento que vêem os estudantes como preguiçosos, desobedientes, sem ambição ou geneticamente inferiores. Os professores que tratam os seus alunos como «atrasados mentais» esquecem-se de que eles próprios são tratados do mesmo modo pelo aparelho administrativo escolar. A pedagogia do atrasado mental aplica-se, pois, tanto aos professores como aos seus alunos: ambos são vasilhas enchidas pelos conteúdos da ideologia opressora. Não se pode planificar aquilo que se desconhece: a cultura na sua possibilidade transcendental. Quando se refugiam por detrás da sua «profissionalização», os professores denunciam-se como aquilo que são: eus colonizados pelo opressor, incapazes de pensar conjuntamente com os seus alunos sobre a realidade que os oprime interna e externamente, de modo a transcendê-la. A pedagogia crítica que só pode ser assumida por aqueles professores que odeiam visceralmente a opressão e a injustiça visa descolonizar o eu dos alunos, de modo a prepará-los para a libertação. A acção pedagógica do teórico crítico da educação regula-se apenas pelo interesse da emancipação: autonomizar os alunos dos efeitos castradores e mutiladores da pedagogia bancária
[71]. A compreensão das estruturas de mediação que formam a resistência estudantil no mundo sociocultural remove o conceito de resistência estudantil das mãos do comportamentalista ou da profundidade do psicólogo, para o inserir no terreno da teoria da sociedade. A resistência à cultura pode converter-se na cultura da resistência. A pedagogia crítica transforma-se então numa pedagogia da resistência, a qual resiste aos obstáculos que lhe colocam as consciências colonizadas, ao mesmo tempo que procura imunizar outras consciências contra esta ameaça.
Como escreve Horkheimer:

«O indivíduo resistente opor-se-á a qualquer tentativa pragmática de conciliar as exigências da verdade e as irracionalidades da existência. Em vez de sacrificar a verdade pela conformidade com os padrões dominantes, ele insistirá em expressar na sua vida tanta verdade quanto possa, tanto na teoria quanto na prática. Terá uma vida conflituosa; deverá estar pronto para correr o risco de uma extrema solidão. A hostilidade irracional que o inclinaria a projectar as suas dificuldades interiores sobre o mundo é superada pela paixão de realizar aquilo que o pai representava para ele na sua imaginação infantil, a saber, a verdade. Esse tipo de jovem — se é que se trata de um tipo — leva a sério aquilo que lhe foi ensinado. Não desiste de confrontar persistentemente a realidade com a verdade, de revelar o antagonismo entre os ideais e as realidades. A sua própria crítica, teórica e prática, é uma reafirmação negativa da fé positiva que teve enquanto criança»
[72].


JOAQUIM FRANCISCO SARAIVA DE SOUSA


BIBLIOGRAFIA


ADORNO, Theodor W. — Dialéctica Negativa. Madrid: Taurus, 1975.
ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995.
ALTHUSSER, Louis — Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. Lisboa: Editorial Presença, 1974.
APEL, Karl-Otto — La Transformación de la Filosofía, 2 vols. Madrid: Taurus, 1995.
APPLE, Michael W. — Ideology and Curriculum. London: Routledge & Kegan Paul, 1977.
APPLE, Michael W. — Educação e Poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
ARENDT, Hannah — A Condição Humana, 7ª Edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995.
BENJAMIN, Walter — Discursos Interrumpidos I. Madrid: Taurus Ediciones, 1989.
BERNSTEIN, Basil — La Estrutura del Discurso Pedagógico IV: Clases, códigos y control, 2ª ed.. Madrid: Ediciones Morata, 1994.
BERTRAND, Yves — Teorias Contemporâneas da Educação. Lisboa: Instituto Piaget, 1991.
BERTRAND, Yves; VALOIS, Paul — Paradigmas Educacionais: Escola e sociedades. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.
BLOCH, Ernst — Le Principe Espérance, 1º vol.. Paris: Gallimard, 1976.
DIAS DE CARVALHO, Adalberto — A Educação como Projecto Antropológico. Porto: Afrontamento, 1992.
DIAS DE CARVALHO, Adalberto — Utopia e Educação. Porto: Porto Editora, 1994.
DOLL Jr., William E. — Currículo: Uma perspectiva pós-moderna. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
FREIRE, Paulo — Pedagogia do Oprimido, 24ª ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
GADAMER, Hans-Georg — Verdade e Método: Traços fundamentais de uma hermenêutica filosófica, 2ª Edição. Petrópolis: Editora Vozes, 1998.
GUATTARI, Félix — Les Trois Ordres Écologiques. Paris: Galilée, 1989.
GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
HABERMAS, Jürgen — Connaissance et Intérêt. Paris: Gallimard, 1979.
HABERMAS, Jürgen — Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1989.
HABERMAS, Jürgen — Mudança Estrutural da Esfera Pública: Investigações quanto a uma categoria da sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1984.
HABERMAS, Jürgen — O Discurso Filosófico da Modernidade. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1990.
HABERMAS, Jürgen — Théorie de l’Agir Communiationnel. 2 vols.. Paris: Fayard, 1987.
HORKHEIMER, Max — Théorie Traditionnelle et Théorie Critique. Paris: Gallimard, 1996.
HORKHEIMER, Max; ADORNO, Theodor W. — Dialéctica de la Ilustración: Fragmentos filosóficos. Madrid: Editorial Trotta, 1994.
ILLICH, Ivan — A Convivencialidade. Lisboa: Publicações Europa-América, 1976.
ILLICH, Ivan — Sociedade sem escolas. Petrópolis: Vozes, 1979.
KINCHELOE, Joe L. — A Formação do Professor como Compromisso Político: Mapeando o pós-moderno. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
MARCUSE, Herbert — El Hombre Unidimensional: Ensayo sobre la ideología de la sociedad industrial avanzada. Barcelona: Seix Barral, 1972.
MARCUSE, Herbert — Eros y Civilización. Barcelona: Ariel, 1981.
McLAREN, Peter — A Vida nas Escolas: Uma introdução à pedagogia crítica nos fundamentos da educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
POPKEWITZ, Thomas S. — Reforma Educacional: Uma política sociológica, Poder e conhecimento em educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

Notas:

[1] Cf. KUHN, Thomas S. — A Estrutura das Revoluções Científicas, 3ª ed.. São Paulo: Editora Prespectiva, 1992.
[2] «O Iluminismo é a saída do homem da sua menoridade de que ele próprio é culpado. A menoridade é a incapacidade de se servir do entendimento sem a orientação de outrem. Tal menoridade é por culpa própria se a sua causa não reside na falta de entendimento, mas na falta de decisão e de coragem em se servir de si mesmo sem a orientação de outrem. Sapere aude! Tem a coragem de te servires do teu próprio entendimento! Eis a palavra de ordem do Iluminismo». Cf. KANT, Immanuel — A Paz Perpétua e Outros Opúsculos. Lisboa: Edições 70, 1992, p.11.
[3] O conceito de reificação foi elaborado exaustivamente por Georg Lukács: «Já muitas vezes se realçou a essência da estrutura mercantil, que assenta no facto de uma ligação, uma relação entre pessoas, tomar o carácter de uma coisa, e ser, por isso, de uma «objectividade ilusória» que, pelo seu sistema de leis próprio, aparentemente rigoroso, inteiramente fechado e racional, dissimula todo e qualquer traço da sua essência fundamental: a relação entre homens». Cf. LUKÁCS, Georg — História e Consciência de Classe: Estudos de dialéctica marxista. Porto: Publicações Escorpião, 1974, p.97.
[4] «O problema da imanente n-ao verdade da pedagogia reside decerto em que o objecto explorado é feito sob medida para os destinatários do processo, não é um trabalho puramente objectivo, pela coisa em si. Esta é antes pedagogizada. Já, por essa única razão, as crianças deveriam sentir-se inconscientemente enganadas. Não só os professores transmitem receptivamente algo já estabelecido, senão que a sua função mediadora como tal, como todas as actividades de circulação, é algo suspeito de antemão desde o ponto de vista social, atraindo certa aversão geral. Max Scheler disse uma vez que ele só produziu efeitos pedagógicos pelo facto de nunca Ter tratado os seus alunos de forma pedagógica. Se me é permitida a referência pessoal, a minha experiência corrobora por inteiro esse ponto de vista. O êxito como professor universitário dá-se evidentemente graças à ausência de todo o cálculo sobre a aquisição de influência, à renúncia a qualquer tentativa de persuasão». Cf. ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.90.
[5] ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.104.
[6] «A natureza desta tristeza torna-se mais evidente quando nos perguntamos com quem é que o investigador historicista entra em intropatia. A resposta é inelutável: com o vencedor. Ora todo aquele que domina é sempre herdeiro de todos os vencedores. A intropatia com o vencedor beneficia sempre, por consequência, aqueles que dominam. Para quem professa o materialismo histórico, isto é suficiente. [...] A sua tarefa é como ele acredita escovar a História a contrapelo». Cf. BENJAMIN, Walter — Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política. Lisboa: Relógio D’Água, 1992, p.161.
[7] Citado por WOLIN, Richard — Labirintos: Em torno a Benjamin, Habermas, Schmitt, Arendt, Derrida, Marx, Heidegger e outros. Lisboa: Instituto Piaget, 1998, p.142.
[8] BENJAMIN, Walter — Sobre Arte, Técnica, Linguagem e Política. Lisboa: Relógio d’Água, p.160.
[9] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, p.172.
[10] Cf. JAY, Martin — La Imaginación Dialéctica: Una historia de la Escuela de Frankfurt. Madrid: Taurus, 1989.
[11] Cf. GAY, Peter — A Cultura de Weimer. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
[12] MARCUSE, Herbert — Razão e Revolução: Hegel e o advento da teoria social, 4ª ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p.38.
[13] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, pp.12-13.
[14] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, pp.11-12
[15] HORKHEIMER, Max — Théorie Traditionnelle et Théorie Critique. Paris: Gallimard, 1974, p.82.
[16] HORKHEIMER, Max — Théorie Traditionnelle et Théorie Critique. Paris: Gallimard, 1974, pp.82-83.
[17] HEGEL, G. W. F. — Princípios de Filosofia do Direito. Lisboa: Guimarães Editores, 1976, p.13.
[18] HORKHEIMER, Max — Teoría Crítica. Barcelona: Barral Editores, 1973, p.73.
[19] LUKÁCS, Georg — História e Consciência de Classe: Estudos de dialéctica marxista. Porto: Publicações Escorpião, 1974, p.15.
[20] Cf. WELLMER, Albrecht — Teoría Crítica de la Sociedad y Positivismo. Barcelona: Editorial Ariel, 1979.
[21] ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max — Dialéctica do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p.13.
[22] ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max — Dialéctica do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p.13.
[23] ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max — Dialéctica do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p.15.
[24] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, pp.31-32.
[25] ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max — Dialéctica do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p.20.
[26] Cf. HEIDEGGER, Martin — Essais et conférences. Paris: Gallimard, 1958, pp.9-48.
[27] Cf. BLOCH, Ernst — Le Principe Espérance, 1º vol.. Paris: Gallimard, 1976.
[28] ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, pp.44-45.
[29] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, pp.104-105.
[30] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, pp.138.
[31] Cf. ADORNO, Theodor W. — Dialéctica Negativa. Madrid: Taurus, 1975.
[32] Cf. ADORNO, Theodor W. — Teoria Estética. Lisboa: Edições 70, 1988.
[33] HORKHEIMER, Max — Teoria Crítica I. São Paulo: Perspectiva/Editora da Universidade de São Paulo, 1990, p.41.
[34] HORKHEIMER, Max — Teoria Crítica I. São Paulo: Perspectiva/Editora da Universidade de São Paulo, 1990, p.74.
[35] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, p.146.
[36] «A dessublimação institucionalizada parece, assim, ser um aspecto da “conquista da transcendência” conseguida pela sociedade unidimensional. Assim como essa sociedade tende a reduzir e até a absorver a oposição (a diferença qualitativa!) no âmbito da política e da cultura superior, também tende a fazê-lo na esfera instintiva. O resultado é a atrofia dos órgãos mentais, impedindo-os de perceber as contradições e as alternativas e, na única dimensão restante da racionalidade tecnológica, prevalece a Consciência Feliz». Cf. MARCUSE, Herbert — A Ideologia da Sociedade Industrial: O homem unidimensional, 5ª Ed.. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979, p.88.
[37] MARCUSE, Herbert — A Dimensão Estética. Lisboa: Edições 70, 1981, p.48.
[38] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[39] MARCUSE, Herbert — Um Ensaio para a Libertação. Amadora: Livraria Bertrand, 1977, p.20.
[40] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[41] ALTHUSSER, Louis — Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. Lisboa: Editorial Presença, 1974.
[42] BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude — A Reprodução: Elementos para uma teoria do sistema de ensino. Lisboa: Vega, s.d..
[43] ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max — Dialéctica do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p.20.
[44] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[45] Cf. FOUCAULT, Michel — Microfísica do Poder, 12ª ed.. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1996.
[46] Cf. FREIRE, Paulo — Pedagogia do Oprimido, 24ª ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.
[47] Cf. ILLICH, Ivan — A Convivencialidade. Lisboa: Publicações Europa-América, 1976, pp.82-83.
[48] Cf. FREIRE, Paulo — Pedagogia do Oprimido, 24ª Ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, pp.101-102.
[49] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[50] Cf. FROMM, Erich — O Medo à Liberdade, 12ª Ed.. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980.
[51] «Não me acanho em confessar-me reaccionário, na medida em que sustento que é mais importante que as crianças aprendam bem o latim na escola, inclusive estilística latina, antes que realizem tolas excursões escolares a Roma que, provavelmente, acabem numa indigestão geral, sem que aprendam qualquer coisa de essencial de Roma». Cf. ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.101.
[52] Cf. SOUSA, Joaquim F. Saraiva de — Razão e Sofrimento: Contra os relativismos contemporâneos. Humanística e Teologia 17 (1996) 47-102.
[53] ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.77.
[54] ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.74.
[55] ADORNO, Theodor; HORKHEIMER, Max — Dialéctica do Esclarecimento: Fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985, p.135.
[56] Cf. DEVEREUX, Georges — Ensayos de Etnopsiquiatria General. Barcelona: Barral Editores, 1973, pp.156-158.
[57] APPLE, Michael W. — Educação e Poder. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[58] Cf. RODRIGUES, Custódio — Manual de Psicologia 2: Motivação. Porto: Contraponto Edições, 1998, pp.244-47.
[59] ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.103.
[60] ADORNO, Theodor W. — Palavras e Sinais: Modelos críticos 2. Petrópolis: Vozes, 1995, p.103.

[61] «Designa-se tradicionalmente por «domesticada» uma raça de animais quando ela se distingue do tronco, que vive no estado selvagem, por certas manifestações típicas e hereditárias que se desenvolveram à medida que foram sendo domesticadas. Em quase todos os animais domésticos se encontram pintas, encurtamento das extremidades e da base do crânio, relaxamento dos tecidos conjuntivos (o que leva à formação de barbelas), as orelhas caídas, baixa do tónus muscular, etc., e, além disso, tendência para engordar, mas principalmente o alargamento absolutamente geral e hereditário do campo de variações de todas as características da espécie». Cf. LORENZ, Konrad — Três Ensaios sobre o Comportamento Animal e Humano. Lisboa: Editora Arcádia, 1975, p.247.
[62] Cf. NETO, Félix — Solidão, Embaraço e Amor. Porto: Centro de Psicologia Social, 1992.
[63] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997, p.28.
[64] ILLICH, Ivan — Sociedade sem Escolas, 5ª Ed.. Petrópolis: Editora Vozes, 1979.
[65] ALTHUSSER, Louis — Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado. Lisboa: Editorial Presença, 1974.
[66] HABERMAS, Jürgen — Mudança Estrutural da Esfera Pública: Investigações quanto a uma categoria da sociedade burguesa. Rio de Janeiro: Edições Tempo Brasileiro, 1984.
[67] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[68] LACAN, Jacques — Le Séminaire de Jacques Lacan. Livre XX: Encore. Paris: Éditions du Seuil, 1975, p.100.
[69] GIROUX, Henry A. — Os Professores como Intelectuais: Rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[70] Cf. POPKEWITZ, Thomas S. — Reforma Educacional: Uma política sociológica, Poder e conhecimento em educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.
[71] Cf. FREIRE, Paulo — Pedagogia do Oprimido, 24ª Ed.. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987, pp.57-61.
[72] HORKHEIMER, Max — Eclipse da Razão. Rio de Janeiro: Editorial Labor do Brasil, 1976, pp.123-24.
(Trabalho publicado em versão mais densa. Diversidade e Identidade. Porto, 1998)
J Francisco Saraiva de Sousa

Sem comentários: